(a perspectiva do encantamento)
Preciso-me antes que desabem os céus que
desenhei na parede suja dos fundos. Quero-me tão pleno antes que o desenho
relampeje e se esvaia em alto-relevo tocando-me o plexo num desespero de
perspectivas revoltas que lambem a atmosfera buscando-me o gosto, o sabor que
talvez perdido macule o gotejar andino daquilo que se torna rio e me afoga
mesmo antes que te respire as fragrâncias por entre as pernas. Sei-me em chamas
maldizendo a solidão daquele fundo de tarde dizendo-me com todas as letras
mortas que o amor é um grande desaforo, uma brincadeira sem retoques nas quais
os brinquedos são frágeis e se arrebentam ao menor descuido. Chamo-te aos
gritos e quem me vem acode ao copo, transborda-o. Escorro-me pela borda,
saliva, seiva, chuva, lágrima em segredo desfeito no borrão da sombra e com o
dorso das mãos sobre os olhos procuro visões que inventem outras estações que
nos vistam nus.
Foto: Pietá nº 1 de Jan Saudek (1971) disponível aqui
Um comentário:
É seu desenho se clareando...
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