domingo, 18 de março de 2012

Carnal Carmim

Na primeira manhã alguém que era deus com a boca pintada chegou.
Os cabelos molhados encharcaram o tapete e o corpo no encontro vitimou outra fatia.
Saia quase nua na sala de um sol quase letal.
Meus olhos executaram sentenças roubando-a de abismos e jogando-a a alguns poetas enquanto eu me despia.
O silêncio parecia agonizar já que enlouquecido pretendia amordaçar-nos com as suas carícias, porém nós o imitávamos e vez em quando o assassinávamos gemendo.
Alguém partiu.
Dúzias de pequenas dúvidas na bolsa e a nítida certeza de que estava completamente sem cigarros.
Preguiçosa olhou-me do semáforo, os olhos temiam o meu desaparecimento.
Nunca imaginaria que os raptos acontecem imperiosos ao entardecer e que alguns poetas choram no exato instante em que as andorinhas adejam até enlouquecerem os expectadores.
Sonhei, outro dia, abraçá-la despudoradamente até causar chamas n’alma.
Ambicionava intimamente fantasias e covardemente sangrei.
Mereci o talho.
Reagi dentro das manhãs repetidas até que exauridas dos passos cotidianos e pasmos fugiram em direção da noite.
Por onde andará o próximo beijo?
Não sei.
Um dia, quem sabe, descubro seus lábios, talvez amordaçados num carmim desesperado e os beije com fogo, bem antes das primeiras manchetes, antes que nos esqueçamos tão sós depois do último instante. 

Fotografia: Rodney Smith
Título original do poema: Cabelos molhados

4 comentários:

Elvira Carvalho disse...

Talvez, quem sabe...
Um abraço e bom Domingo

malaguetasweet disse...

Vir por aqui é sempre um passeio pela pele...Boa Semana, Bjssssssssss

Anônimo disse...

ay ay ...que bella y melancólica mirada!gracias
lidia-la escriba

Vanuza Pantaleão disse...

"Por onde andará aquele beijo?"
Beijos, olhares, carícias que nunca foram dadas.
Uma espécie de saudade do que não aconteceu.
Adorei mesmo!
Beijos, Serginho!

Twittando

    follow me on Twitter