domingo, 25 de outubro de 2009

O silêncio da deserção


Até onde sei calei-me não de um silêncio convicto, mas de um vazio de olhares, calei-me da ausência de verbos irregulares que pudéssemos conjugar sem pressa numa única pessoa enquanto os festejos perseguissem as horas. Calei-me de marés altas e da fartura as tantas, calei-me de conveses abandonados e porões inda mergulhados na tinta fresca da memória. Calei-me de silêncios entrincheirados argutos acompanhando-me os passos, e calei-me das aventuras impróprias que adormeciam antes que eu retornasse dos caminhos incorpóreos do sonho. Calei-me das agressões que me lamberam as faces e me atiraram aos leões, calei-me dos milagres viciados nas esquinas, das aparições paridas no cortejo fumegante dos cafés, calei-me para ver-te dançar, requebrar-se cabrocha, contorcer-se odalisca, misturar-se aos sons inaudíveis da extrema-unção. Calei-me das terminologias, das aliterações, calei-me das dormências e dos sacrifícios, calei-me de calores incontidos e dos bons modos e quando arremessado contra a turba calei-me num voo cego. Até onde sei, procurei nas fechaduras, ranhuras, brechas, portas entreabertas calar-me mais do que pensei e apenas ressenti o mal dos carinhos noturnos. Calei-me amanhecendo com as fuças ainda cheias de sua genitália, calei-me no corte da navalha e na lavanda das prostitutas, e calei-me destas cruezas abstratas que desenham seres pavorosos nos noticiários e incensam as poucas verdades veladas atrás das portas. Calei-me dos trovões e dos ruídos que desciam as escadas na ponta dos pés; bailarinos meninos escondidos vizinhos deitados ao meu lado. Calei-me destas cerrações que nos fazem sombras dentro das espirais de um mundo em movimento, e calei-me destes mesmos movimentos puxando todas as gavetas de um caminho de pedras e fragmentos e vísceras e autores catalogados no silêncio das bibliotecas. Calei-me das especiarias e sob o cutelo dos magos calei-me por definição e muito mais do que pensei.

15 comentários:

f@ disse...

Olá Sérgio,
Teimar o silêncio… calar ou o grito…
O olhar de pedra no doce do sonho…
Eu não sei explicar esse sabor do sol a espreitar as nuvens… nem o vento que as empurra e enfeita em movimento declamado o …silencio tão poético como a dança das ondas… um barco…
O silêncio não tem horizontes, é grito…

!nfinito beijinho

disse...

Sérgio,

...
sabes como é o silêncio no charco... onde as rãs cantam a noite, a água, e como calam os seres humanos...
... coaxar nesse pântano azul e verde pinho... balsamo para a alma...
como o teu texto clama...
como se uma rã subisse nas asas de um pato selvagem... como o vento ...

abraço gigante e beijinho

ANALUKAMINSKI PINTURAS disse...

...E é a partir do silêncio e do nada, das pausas, que nascem todos os sons, vozes, cantos e poesias!!!

Abraços alados, suaves e silenciosos.

Vanuza Pantaleão disse...

Sérgio, querido amigo!
Esse silêncio tem mil vozes e sortilégios...
Como me deixo levar por essas trilhas que você nos deixa aqui!
Ah, hoje eu vou "brigar". Já tenho fama mesmo!
Não sumaaaaaaaaaaa...
(tô até desconfiada que escrevo mal pra dedéu)
Carinhos mil!!!

Vera Basile disse...

Esse seu SILÊNCIO...fez um barulhão!...
Bjs...
ps:voltarei mais vezes pra silenciar-me.

Vanuza Pantaleão disse...

Calo-me também, amigo...calo-me por tudo o que disseste. Será que ouvirão nossos silêncios.
Tá vendo por que gosto de você por lá? Fico no maior alto-astral, hahahaha.
Êta moço pra escrevê bunito, sô!!! Bjsssss

Vanuza Pantaleão disse...

Faltou a interrogação. Daí, repito:
"Será que ouvirão nossos silêncios?"
Aquela varandinha...

Anônimo disse...

Sérgio, como disse Veroca: seu silêncio fez barulho. E não vou me silenciar não...

"ausência de verbos irregulares que pudéssemos conjugar sem pressa".

Estamos, os dois, buscando o verbo perfeito, não?

A propósito, segui sua sugestão e reli meu Post Between ouvindo Peter Gast, de Caetano. Se eu conhecesse a música diria que fui influenciada por ela. Mas agora o contrário ocorreu, preciso escrever sobre o que estou ouvindo... e te agradeço pelas palavras no blog!

Beijo meu. Estalado. Corrompendo o silêncio.
Bia

Elvira Carvalho disse...

Calou-se, gritando sentimentos dispersos como quem lança bolas de sabão.
Um abraço e bom fim de semana

f@ disse...

...
e esta noite vem a fada do silencio e grita-te bem alto um segredo...
depois, esquece a varinha que tu guardas tb em silêncio...

boa noite das bruxas
!nfinito beijinho

Unknown disse...

Olá amigo Sérgio, vim fazer uma visitinha, e dizer que eu calo muitas vezes até demais, mas adorava dar um bom grito, principalmente com certas pessoas.
Não consigo claro.

Abraço grande
Manuela

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        ██▒▒▒▒██____esteja sempre
         █████___com VOCÊ

Tenha uma ótima semana beijos.

f@ disse...

Olá Sérgio,

...

sempre
o B E L O...

Infinito beijinho

Anônimo disse...

Oi, Sérgio.
É verdade esse texto é um daqueles que nos chacoalham. Foi escrito pela dona do blog 'dedos não brocham', que eu encontrei por acaso nesse mundo louco da internet. Gostei tanto que coloquei lá no Strawberry Fields.
O blog dela é ótimo!

beijos e ótima semana! :)

Anônimo disse...

Caiu muito bem o trecho que você citou dos Titãs.
A menina nem se manifestou. Normalmente não sou de 'briga', mas em casos como esse não fazer nada é aceitar.

Então, aquele foto foi tirada em 79, época em que os meus pais namoravam. São o casal da frente. O cara com o violão é o meu pai. :)

obrigada mais uma vez!

beijos

Joe_Brazuca disse...

ungi-me do teu calar
que fala, esperneia
não duvida , nem à luz-meia
e não se priva de falar...

Bom !...vc é fera !

(ah, vc tb está lincado no meu...blog...rsrsrs)

abraço, Sergio !

Joe

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